5 de abril de 2010

"Changing Machiya" - Inauguração Amanhã da Exposição de Pedro Besugo, em Quioto


'Changing Machiya

"É um domicílio do assimétrico, na medida em que se consagra à adoração do imperfeito, deixando propositadamente algo inacabado para que seja completado pelo jogo da imaginação.” (Kakuzo Okakura).

Na era dos Descobrimentos, hoje vista como a da primeira Globalização, Portugal não se limitou a gozar no repouso da “pequena casa lusitana”. Escolhido para mais altos destinos, a sua projecção no Mundo teve um alcance tão notável que a consagração desse seu papel de difusor cultural encontra ainda hoje eco na alma portuguesa. No Oriente, criou novas pátrias nascidas do seu sangue, espalhou o seu idioma, difundiu os seus costumes, e imprimiu o seu carácter em longínquos lugares e estranhos povos. E recolheu tanto deles como o que levou.

Quando os Portugueses chegaram ao Japão em 1543, este era conhecido na Europa desde o tempo de Marco Pólo, mas foram efectivamente eles os primeiros europeus a visitá-lo e conhecê-lo. O contacto entre Portugal e o Japão deixou-nos marcas duradouras e essas marcas acabaram por se reflectir também em mim. Sempre me chamou a atenção a transformação geográfica dos locais, e neste preciso lugar ninguém fica indiferente às características da cidade de Quioto, a cidade das “Machiyas”. O segredo do espírito que preside à sua construção encontra-se num conceito estético e filosófico complexo e, ao mesmo tempo, tão harmonioso e tão simples. As melancólicas casas de madeira sobreviveram à guerra e às mudanças de necessidades do homem, como se fossem mutantes, sem outro suporte que não a simples madeira, e é com as suas paredes nuas que compõem um espaço.

O ”mapa” da cidade está a mudar e lugar habitado também. Quioto, outrora Capital Imperial Japonesa, ou a Lisboa antiga dos navegantes, encontram-se e fundem-se aqui numa só, podendo-se avistar como prolongamento do mesmo lugar. O circuito reinventado por cima das tradicionais imagens são pinturas de casas de madeira, resistentes à moderna arquitectura, e sobrepostas ao “esfumato” das gravuras. Os percursos são coloridos na cartografia das gravuras anteriores ao grande terramoto de 1755 na cidade de Lisboa, e são misturados com pequenos circuitos rectilíneos do mapa actual de Quioto. E sobrepostos são também fragmentos de mapas centenários.

Se o simbolismo é familiar, a distância é protectora e, além disso, garante uma via aberta para a recepção da influência entre as duas culturas. Mais uma vez os suportes da pintura são caixas de madeira, a matéria por excelência. Também usadas como alusão directa à estrutura e ao corpo de construção das “Machiyas”, pela sua tridimensionalidade, estão destinadas a conter um desejo e , simultaneamente, a exporem numa verdade calorosa como é só possível experimentar na própria natureza, também ela impermanente, das condições geográficas e físicas.

Pedro Besugo'

6-18 Abril 2010 @ The Museum of Kyoto, Sanjo-Takakura,Nakagyo-ku,
Kyoto, 604-8183, Japan